Confins do Universo 203 - Literatura e(m) Quadrinhos
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Jornal francês lança edição especial de Tintim

13 fevereiro 2004

Tintim numa edição especial do jornal Le FigaroComo parte das comemorações dos setenta e cinco anos de Tintim, o Le Figaro, tradicional jornal francês, lançou em janeiro deste ano uma edição especial, intitulada Tintin - Reporter du Siècle.

Coerente com a idéia expressa pelo título, a publicação apresenta as mais diversas faces do topetudo herói ao longo do turbulento século XX. De um período que vai de 1929 a 1976, privilegia-se as transformações do personagem nos planos estético e político, além de algumas palavras sobre as adaptações do personagem ao cinema, e a sua influência sobre a linguagem cinematográfica.

Consta ainda uma pequena nota sobre o futuro filme a ser dirigido por Steven Spielberg, projeto há muito desejado pelo criador de Indiana Jones.

Tintin - reporter du Siècle é, sob muitos aspectos, uma edição para fãs que funciona perfeitamente para neófitos. Há análises para os vinte e quatro álbuns que apresentam detalhes e leituras inéditos para os iniciados, mas todo este trabalho lança mão de um discurso ideal para atrair novos leitores.

Além dos comentários, há, ao longo deste especial, bem cuidadas reproduções, em página inteira, para destacar quadrinhos de aventuras como Tintin en Amerique, Les Aventures de Tintin, reporter du Petit Vintième au Congo e Le Crabe Aux Pince D´Or, as quais dão ao leitor um belo quadro da evolução do traço dos personagens e background.

Para um personagem que acompanhou transformações históricas como a Rússia Bolchevique, as guerras coloniais, a guerra fria, a luta pelo controle do petróleo, as ditaduras da América Latina, a corrida espacial e debates éticos associados, Tintim suscita, há muito tempo, uma reflexão sobre as idéias políticas que permeiam estas aventuras.

Este debate ganha especial dimensão pelas acusações de que Hergé, durante a Segunda Guerra Mundial, teria colaborado com os nazistas.

A edição da Le Figaro passa ao largo desta ultima questão, e prefere defender a tese de que Tintim "(...) não é porta-voz de seu criador, mas um testemunho das idéias de seu tempo", segundo o crítico literário Sébastien Lapaque. Este se reporta à tese de Marcel Proust de que "um livro (no caso, uma HQ) é o produto de um outro eu (criador), do que aquele que nós manifestamos em nossos hábitos, na sociedade, em nossos vícios."

Assim, segundo o mesmo crítico, o repórter e Milou são corajosos viajantes dos quatro cantos do mundo e privilegiados observadores das contradições que encontram. A opção por estas ou aquelas situações limite, e a maneira como são mostradas devem ser, conseqüentemente, compreendidas dentro de seu contexto histórico original.

Um dos exemplos do quão sensível foi Hergé a estas transformações são duas reproduções de uma mesma cena, da primeira e segunda versão da aventura no Congo: na primeira, Tintim, em pleno Congo Belga, dá uma aula a jovens africanos sobre a terra destes, no caso, a Bélgica; na segunda versão, a atual, devidamente redesenhada, na mesma cena, Tintim ministra uma aula de matemática. Ele não poderia ficar indiferente à independência da colônia belga na África!

Na chave do debate ético, as aventuras de Tintim são ricas em outras situações que, não raramente, oferecem aos leitores críticas mordazes a personagens de origem ocidental. Dois exemplos: os gangsteres norte-americanos, de Tintin en Amerique, e o militar golpista do terceiro mundo, em Tintin et Les Picaros.

A revista vem ainda com um encarte que oferece uma miniatura dos personagens e objetos presentes na capa do citado álbum da aventura africana. Por três euros e noventa centavos, algo em torno de doze reais, recebe-se em casa o toy. Só que se deve prestar atenção a um "pequeno" detalhe: a promoção é valida somente para os residentes em território francês.

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