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CHIBATA! JOÃO CÂNDIDO E A REVOLTA QUE ABALOU O BRASIL

1 dezembro 2008


Autores: Olinto Gadelha Neto (roteiro) e Hemeterio (arte).

Preço: R$ 39,90

Número de páginas: 224

Data de lançamento: Outubro de 2008

Sinopse: No dia 22 de novembro de 1910, cansados de serem tratados
como escravos, marujos (quase todos negros) dos principais navios de guerra
da Marinha brasileira se rebelam, liderados por João Cândido, no que mais
tarde seria batizado como Revolta da Chibata.

Eles ameaçam bombardear a cidade do Rio de Janeiro, então capital federal,
pouco depois da posse do presidente da República, Hermes da Fonseca. Em
troca, pedem apenas o fim da chibata (chicotadas ou pauladas aplicadas
ao dorso dos marinheiros pelos oficiais em caso de indisciplina ou "desobediência")
e igualdade em quesitos básicos, como alimentação - até então, os comandantes
tinham comida farta, enquanto os subalternos ficavam com o que restava
a bordo.

A vitória que obtiveram durou pouco tempo, pois a anistia concedida pelo
governo se mostrou uma farsa, e o troco dado pelos almirantes foi devastador.
Começava a ser escrito um capítulo da História do Brasil que por muito
tempo seria ocultado.

Positivo/Negativo: E a Conrad acertou em cheio. De novo.
Chibata! é mais um exemplo de quanto o quadrinho nacional pode
ter qualidade, mesmo abordando assuntos da nossa História, que permaneciam
esquecidos ou até desconhecidos. Ao resgatarem a epopéia de João Cândido,
o Almirante Negro, Olinto Gadelha e Hemeterio não apenas constroem uma
grande HQ, mas prestam um serviço ao País.

Isso porque a história de João Cândido, que por tanto tempo foi vergonhosamente
escondida pela Marinha brasileira, precisa ser conhecida. Na época
em que aconteceu, jornalistas que tentaram retratá-la foram intimidados.
Mesmo muitos anos depois, na década de 1970, os compositores João Bosco
e Aldir Blanc tiveram problemas com a censura da ditadura militar por
causa das referências à Revolta da Chibata e seu líder.

Por isso, fica desde já a torcida para que este álbum extremamente bem
produzido graficamente seja lido por muita gente. Que ganhe bibliotecas
Brasil afora e seja escolhido por algum plano governamental de apoio à
leitura.

E que fique bem claro: não por ufanismo, pois também há no mercado diversas
HQs nacionais ruins. Não é o caso de Chibata!. A trama, calcada
em muita pesquisa, mas entremeada de fatos ficcionais, foi muito bem construída
por Olinto e o que mais chama a atenção é a competência da narrativa,
que vai e vem no tempo, mas, em momento algum, dificulta a leitura.

Não há páginas carregadas de texto, discursos modorrentos ou didática
exagerada. Olinto usa sabiamente a dura história de João Cândido e seus
companheiros e constrói uma trama envolvente, com páginas que nem sequer
precisam de balões de texto e personagens cativantes. Assim, mesmo sabendo
que o protagonista não tem como se dar bem no final, o leitor se apanha
a torcer por um desfecho diferente.

A arte competente de Hemeterio se encarrega de tornar a obra ainda mais
atrativa. Seu desenho passa longe do virtuosismo e até tende a uma linha
mais humorística. No entanto, a construção das cenas e seu ótimo domínio
de luz e sombras dão ao roteiro um ritmo cadenciado, na medida certa.

Vale notar que o desenho parece evoluir do início ao fim do livro. É natural.
Numa obra com mais de 200 páginas, Hemeterio evidentemente as fez em diversos
momentos e, conforme foi "vivendo" a história, maturou sua arte.

O fato de todas as páginas da HQ serem com as bordas pretas e as aberturas
de capítulos serem totalmente brancas também deu um charme especial ao
trabalho.

Muitos anos atrás, o mestre Flavio
Colin
já dizia que o Brasil tinha uma imensidão de grandes histórias
para serem contadas. Fossem elas verídicas ou fictícias. Chibata!
é uma delas.

Afinal, apenas recentemente João Cândido ganhou o reconhecimento merecido,
graças à liberação de seus arquivos pela Marinha, à inscrição de seu nome
no Livro dos Heróis da Pátria e à anistia post-mortem concedida
a ele em 2008. Só 98 anos após a Revolta da Chibata, é que muitos brasileiros
conhecerão essa incrível - e triste - história. E é ótimo saber que esta
versão em quadrinhos ajudará a disseminá-la.

Classificação:

4,0

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