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CLARA DOS ANJOS

1 dezembro 2012

CLARA DOS ANJOS

Editora: Quadrinhos na Cia. - Edição especial

Autores: Wander Antunes (roteiro) e Marcelo Lelis (arte), adaptando o romance homônimo de Lima Barreto.

Preço: R$ 42,00

Número de páginas: 112

Data de lançamento: Novembro de 2011

 

Sinopse

Clara dos Anjos é uma mulata pobre do subúrbio, filha do carteiro João dos Anjos e de Engrácia, uma mulher "sedentária e caseira".

Por meio de amigos do pai, Clara conhece Cassi Jones, malandro de família mais abastada e notório galanteador.

A despeito dos alertas de seu padrinho, Clara inicia uma relação com Cassi.

Positivo/Negativo

Num período em que vingavam na literatura brasileira as estéticas parnasiana e simbolista, tendo a forma mais peso do que o conteúdo, Lima Barreto ousou empregar a linguagem coloquial em seus contos e romances, destacando sempre os excluídos da sociedade, como os suburbanos, pobres, negros, mestiços e boêmios.

Esse flerte com o realismo dificultou o reconhecimento de Lima Barreto como um escritor soberbo entre seus pares à época, mas não o impediu de seguir produzindo e denunciando, em suas obras, a hipocrisia que imperava na sociedade carioca do início do Século 20, tão moderna e conservadora quanto a República que se estabelecia.

A bebida e o histórico de doença mental da família fizeram o autor partir muito cedo, aos 41 anos de idade, deixando obras incompletas, publicadas postumamente.

Em comemoração aos 130 anos do escritor, em 2011, a Cia. das Letras iniciou um projeto de reedição das suas obras, coordenado por Lilia Moritz Schwarcz. Fazia parte do projeto a adaptação do último e inconcluso romance de Lima Barreto, Clara dos Anjos, em forma de graphic novel.

A Wander Antunes e Marcelo Lelis coube a tarefa de recontar a história de Clara, jovem mulata sonhadora, que se apaixona pelo "modinheiro" de família mestiço-clara e pseudo-aristocrática Cassi Jones, mesmo sendo alertada sobre seu mau caráter.

Cassi era conhecido por seduzir e engravidar diversas moças do subúrbio, e depois "tirar o time de campo". O que lhe motivava era a certeza de que seus atos ficariam impunes, além de poder contar com o apoio de sua mãe, Dona Salustiana. A megera tinha o "rei na barriga", inventando pra si uma ascendência inglesa, com o objetivo de distinguir-se das demais famílias mestiças suburbanas.

Clara, completamente cega pela paixão, acreditava piamente que Cassi era seu príncipe encantado, sua salvação. Seus sonhos se desmancham na areia e ela acorda para a cruel realidade da República brasileira, a qual foi instituída para trazer progresso e democracia ao País, mas continuava privilegiando apenas a camada "clara" da população - negros e mestiços "eram nada nessa vida", assim como se sentia o próprio Lima Barreto.

No entanto, é fácil ver que o autor preconizava uma alternativa para os marginalizados, na personagem de Dona Margarida, que aconselhou Clara a se valorizar, estudar e aprender um ofício, únicas armas para enfrentar os "Cassi Jones da vida" - embora o pessimismo que lhe era particular tenha sido retratado no conformismo de Clara, quando ele interrompeu a narrativa.

Antunes repassou para os quadrinhos todos os trejeitos da "estranha gente" do subúrbio, apresentados por Lima Barreto, que ganhou expressividade na sutil arte de Lelis, cujo traço tem influência direta do desenhista francês Nicolas de Crécy, numa esplêndida aquarela sobre nanquim, trazendo uma paleta de cores ao mesmo tempo sóbria e vibrante, resgatando as vielas, os meios de transporte, os modos e a moda do Rio de Janeiro da década de 1920.

A edição ganhou um excelente posfácio de Lilia Schwarcz, e Lelis também conta como foi o processo criativo e a elaboração do design de cada personagem.

 

Classificação:

4,0

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