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Diário do Chaves

22 dezembro 2014

Diário do ChavesEditora: Ponto de Leitura/Objetiva – Livro de bolso

Autor: Roberto Gómez Bolaños (texto e arte).

Preço: R$ 15,90

Número de páginas: 168

Data de lançamento: 2006

Sinopse

A difícil vida de um garoto de rua chamado Chaves, contada por ele mesmo, em seu diário, esquecido no chão quando ele engraxava os sapatos do comediante Roberto Gómez Bolaños, que resolve compartilhar essa comovente – e não menos divertida – história.

Positivo/Negativo

Se fosse necessário resumir Diário do Chaves em apenas uma palavra, certamente a escolhida seria... surpreendente.

O apelo imediato da capa, com o personagem em sua pose icônica, dentro do barril que lhe serve de abrigo, não prepara o leitor para a história dramática, comovente e, em alguns momentos, chocante que as páginas do livro apresentam.

Utilizando o artifício de se encaixar na trama como alguém que encontra um relato extenso e interessante e resolve transcrevê-lo em um livro – assim como J. J. Benitez fez na série Operação Cavalo de Troia –, Roberto Gómez Bolaños narra seu encontro com Chaves, um menino de oito anos que sobrevive nas ruas engraxando sapatos e cujo diário esqueceu no chão, depois de realizar seu trabalho e faturar uns trocados.

Alertando que foi necessária uma “correção ortográfica” no texto do garoto, além de uma interpretação de trechos ou palavras apagadas das páginas amassadas e sujas do diário, Bolaños abre as cortinas para aquilo que qualquer fã do personagem gostaria de saber: de onde ele veio, onde mora e como conheceu aquela famosa turma da vila.

Mas é a partir daí que o leitor é pego de surpresa. O relato inicial é triste, a ponto de um fã menos preparado se sentir incomodado. Isso porque os maus-tratos num orfanato, a privação de alimentos como castigo, a ausência de um pai e o abandono da mãe são elementos inesperados para quem imaginava começar a rir já na primeira página.

Bolaños ainda lança mão de alguns recursos para mexer com essas emoções, como usar somente o seguinte trecho centralizado numa única página: “Um dia, minha mãe não passou pra me pegar. E nos outros dias também não.”

E o relato prossegue com Chaves começando a viver nas ruas e travando contato com a maconha e a cola de sapateiro, passando a morar com um homem que cuida de carros e leva mulheres para “fazer coisas” com elas no banco de trás e, por fim, presenciando a morte de outro menino de rua.

Mas bastou ao garoto chegar à vila e conhecer Quico, Chiquinha, Seu Madruga, Dona Florinda, Professor Girafales, Seu Barriga, Dona Clotilde (a “Bruxa do 71”) e outros moradores para o humor ora ingênuo, ora sarcástico desfilar pelo livro.

Ainda assim, o que faz rir aqui é muito diferente daquilo que provoca gargalhadas na TV. Há elucubrações divertidas sobre assuntos diversos, principalmente nos depoimentos sobre as aulas do Professor Girafales.

Também estão no livro os bordões “Foi sem querer querendo”, “Gentalha, gentalha!” e todos os outros que fãs de qualquer idade não cansam de repetir – mas cada um deles é citado apenas uma vez, usado somente como uma frase dita em determinado momento da vida de Chaves.

Na verdade, o humor deste diário carrega, em sua maior parte, reflexões sobre desigualdades sociais e econômicas, baixo nível educacional, falhas de caráter e outros tópicos que, mesmo fazendo rir, despertam um sentimento de melancolia.

Para reforçar isso, as dezenas de ilustrações de Bolaños – outra faceta do artista era a de exímio desenhista –, retratando personagens e cenários, não destoam do clima realista que o livro consegue transmitir. Não há desenhos caricatos, embora a fisionomia de cada morador da vila esteja muito próxima dos traços dos atores que os interpretaram na TV.

Chaves e Chiquinha

O livro chega ao fim com um longo depoimento de Florinda Meza (cujo sobrenome está erroneamente grafado como “Meca”) – a Dona Florinda do seriado e hoje viúva de Bolaños –, sobre o sucesso e a idolatria que Chaves continua conquistando em dezenas de países, incluindo o Brasil: “Depois que chegou ao país, rapidamente desbancou a Xuxa, insuperável ídolo local”, disse ela.

Escrito originalmente em 2005, Diário do Chaves traz consigo a mesma singularidade que caracteriza a série de TV do garoto apaixonado por sanduíche de presunto: pode ser apreciado quantas vezes alguém desejar, sem perder o encanto. Não importa o intervalo de tempo.

Classificação

4,5

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