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A História de Joe Shuster – O artista por trás do Superman

24 dezembro 2018

A História de Joe Shuster – O artista por trás do SupermanEditora: Aleph – Edição especial

Autores: Julian Voloj (roteiro) e Thomas Campi (arte) – Originalmente em The Joe Shuster Story (tradução de Marcia Men).

Preço: R$ 59,90

Número de páginas: 192

Data de lançamento: Novembro de 2018

Sinopse

Você já conhece a história do Superman. Um garoto alienígena vindo de um planeta extinto, que cresce em uma cidade interiorana e se torna o maior herói que a humanidade já viu. Mas, após 80 anos como um dos principais personagens da cultura pop, ainda hoje poucos sabem em detalhes a trajetória de seus criadores: dois garotos sem superpoderes, mas cheios de talento e ideias fantásticas.

Enquanto Jerry Siegel (com suas histórias) e Joe Shuster (com seus desenhos) apenas sonhavam em ganhar a vida publicando quadrinhos, quis o destino que o mundo nunca mais fosse o mesmo frente a sua criação.

A história de Joe Shuster volta no tempo para contar os percalços e as alegrias de um artista que revolucionou a nona arte e deu início à Era de Ouro dos quadrinhos nos Estados Unidos, além de narrar o desenvolvimento dessa indústria ao longo das décadas.

Positivo/Negativo

O epicentro da história é bem conhecido pelos leitores veteranos: no início, a “serpente” empreendedora ofereceu meros 130 dólares aos jovens inocentes e entusiasmados Jerry Siegel (1914-1996) e Joe Shuster (1914-1992) para ser dona de seu ticket para o paraíso, uma ideia que tinha muito potencial para ser sucesso. “O” super sucesso.

Tida como “o pecado original dos comics” pelo pesquisador e ex-editor do The Comics Journal, Tom Spurgeon, a trajetória dos criadores, com enfoque maior em Shuster, é pincelada com aquarelas do italiano Thomas Campi.

Sem dúvida, esta obra é a mais significativa lançada por aqui no ano em que o Superman se torna octogenário. Não obstante, vale lembrar que é uma visão muitas vezes recriada com base em pesquisa, o que pode valer de certas liberdades ou especulações, algumas vezes legitimadas ou ignoradas nas notas no final da edição.

Como é aberto no texto das notas, é uma narrativa ficcional meticulosamente pesquisada, o que não significa que tudo seja verdade absoluta.

O roteirista alemão Julian Voloj – coautor de Ghetto Brother – Uma lenda do Bronx (Veneta, 2016) – teve acesso às cartas de Shuster doadas para uma universidade, além de vídeos e áudios que indica nas notas, bem como entrevistas, matérias e livros sobre o tema.

Um desses livros foi publicado no Brasil, apesar de ser muito difícil encontrá-lo atualmente: Homens do Amanhã – Geeks, Gângsteres e o Nascimento dos Gibis, de Gerard Jones, lançado pela editora Conrad, em 2006.

Há também a “atualização” de informações, como no caso da morte do pai de Jerry Siegel, tido como vítima de um tiro durante um assalto em Homens do Amanhã. Segundo Voloj, novas fontes apareceram recentemente, citando por meio de um relatório do legista que a causa mortis foi um ataque cardíaco no mesmo incidente.

Assim como gêmeos siameses, há pontos vitais nos quais não se pode contar separadamente a história dos dois judeus de Cleveland, fãs de ficção científica, tiras de jornal e pulps, cujos sonhos resistiam à realidade dos Estados Unidos pós-Depressão.

Em alguns pontos (fora os evidentes, como mostra a árvore genealógica de Shuster), percebe-se o esforço em dar mais atenção ao desconfiado e tímido desenhista nascido no Canadá.

Isso já se justifica pelas posturas desenhadas de cada um dos criadores do Superman. Siegel é mais inquieto, “esquentado” (não no nível de um Jack Kirby) e se mostrava ser mais uma espécie de porta-voz quando eles testemunhavam brotar uma mina de ouro de milhões de dólares, da qual não voaria nem um centavo para dentro de seus bolsos.

Já Shuster tinha menos proatividade nas questões de reivindicações legais e negociatas com os engravatados da National, que viria a ser a DC Comics. Essa maneira de ser naturalmente coloca ele em um segundo plano, um dos prováveis motivos que levou Julian Voloj a lhe dar esse protagonismo aqui.

Tanto que são compreendidas as diferentes ações da dupla para manter em contato com a sua maior criação, mesmo Shuster tendo como suas piores “kryptonitas” uma doença espástica, que o impediria de desenhar por tempos mais prolongados, e o seu problema de visão.

Esse último tópico é bastante curioso no desenrolar da narrativa. Ao contrário de Siegel, que sempre está de óculos (como Clark Kent, o alter ego do Homem de Aço), Shuster reluta em usá-los, como forma de não admitir a sua fraqueza/constrangimento/falta de visão. Note qual é a primeira passagem na qual ele “se disfarça” e, ao mesmo tempo, enxerga nitidamente a sua realidade.

Um adendo interessante, levantado pelo fã Fábio Marques, do site Super-Homem.com, é que na vida real Siegel não usava óculos, e Shuster, sim. Este artifício visual usado no álbum faz toda a diferença na narrativa.

Como curiosidade, a HQ mostra coadjuvantes da DC que foram criados por Siegel em parceria com outros desenhistas e traz pequenas participações de grandes nomes da indústria dos comics, como William Gaines (1922-1992), Will Eisner (1917-2005), Stan Lee (1922-2018) e Neal Adams, dentre outros.

Em especial as aparições do cocriador do Batman, Bob Kane (1915-1998), odiado por Jerry Siegel. Sabe por que os direitos de criação do Homem-Morcego teve caminho diferente, mesmo sendo personagens contemporâneos? Por causa de uma cartada de Kane, revelando seu “Coringa”.

Do chão, eles observavam o Superman escapar para o alto e avante, ao mesmo tempo em que viam outras duplas terem propostas bem melhores, como Joe Simon (1913-2011) e Jack Kirby (1917-1994) com seu Capitão América.

A arte de Campi provoca ares nostálgicos que lembram antigos anúncios publicitários do american way of life. Nas sequências dos anos 1970, ele define os contornos, abandonando nas demais.

Pelo motivo de ser uma obra biográfica, a narrativa do gibi é naturalmente mais expositiva do que sequencial, o que não impede o desenhista de imprimir dinamismo quando lhe é solicitado. Esse lado mais expositivo poderia ser deixado um pouco de lado no desfecho, que, nesses moldes, faz parecer um pouco abrupto, menos trabalhado para o arremate.

Há passagens bem inventivas, como a transformação de Bob Kane; outras carregadas de liberdade poética, como a saída de cena do psiquiatra Fredric Wertham (1895-1981) – autor de A Sedução dos Inocentes; e algumas bem clichês, como apresentar um figurão dono de parque gráfico que só pensa em lucrar segurando uma pomposa nota de dólar, fumando um charuto e mostrando um sorriso de satisfação.

A edição da Aleph, que estava desaparecida no mercado de quadrinhos, tem capa cartonada com orelhas e aplique de verniz no título, formato 16 x 23 cm, papel couché de altíssima gramatura e impressão, além de várias páginas destrinchando em notas a história (com alguns escorregões de revisão nessa parte), capas não utilizadas, estudos da arte e textos de Chelle Mayer, neta de um dos editores responsáveis por descobrir o Superman, e Sidney Gusman, editor-chefe do Universo HQ.

Ao lado do igualmente excelente É um pássaro... (NewPop, 2012), A História de Joe Shuster figura como a mais importante saga de bastidores do mundo dos quadrinhos ligada ao Homem de Aço.

Classificação:

4,0

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