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NEED MORE LOVE – A GRAPHIC MEMOIR

1 dezembro 2008


Autores: Aline Kominsky Crumb (texto e arte), com arte adicional de Robert Crumb, Sophie Crumb, Phoebe Gloeckner, Carole Tyler e Diane Noomin e entrevista conduzida por Zaro Weil.

Preço: 20 libras

Número de páginas: 384

Data de lançamento: Fevereiro de 2007

Sinopse: Autobiografia em quadrinhos de Aline Kominsky Crumb, mulher do criador de Fritz The Cat e pioneira dos quadrinhos autobiográficos femininos nos Estados Unidos.

Positivo/Negativo: Há quem pregue que, nos dias de hoje, não é preciso importar quadrinhos, porque tudo o que é relevante acaba, cedo ou tarde, saindo no Brasil. Trata-se, naturalmente, de uma falácia, provavelmente forjada no calor gerado pelo aquecimento do mercado nacional de HQs. Uma olhada rápida em qualquer lista séria de melhores HQs dos últimos anos mostra o tamanho do equívoco - isso sem falar de clássicos engavetados.

A autobiografia de Aline Kominsky Crumb é um exemplo disso. Pelo mundo afora, foi um dos álbuns mais elogiados do ano passado. Mesmo assim, não há indícios de que ela será publicada por aqui. Pelo contrário: seu lançamento seria uma aposta ousada e arriscada.

Por estas bandas, afinal, Aline só é conhecida popularmente por ser casada com Robert Crumb. E olhe lá!

Falando-se assim, até soa injusto. Não é o caso, como a própria quadrinhista destaca: ela por acaso se casou com um dos poucos talentos das HQs com força para ofuscá-la. Não só sabe disso, como regozija-se no papel de musa.

Mesmo assim, não chega a ser uma autora inédita. Em 1991, quando a L± publicou Minhas Mulheres, suas co-criações com o marido já constavam do álbum, ainda que apenas modestamente creditadas no miolo. Entre elas, havia até peças da cultuada série Dirty Laundry Comics, em que o casal mostra que roupa suja se lava é nos quadrinhos.

Mas Aline é bem mais que isso do que a primeira dama dos comix. Nos anos 60, publicou seus quadrinhos underground antes ainda de encontrar Crumb. Seu trabalho saiu em revistas como Wimmen's Comix e seu próprio título, Twisted Sisters.

Naqueles dias, sem saber, foi pioneira de um gênero que tem dado o que falar nas HQs nos últimos anos: a autobiografia feita por mulheres. É, assim, precursora de nomes como Alison Bechdel (Fun Home), Rosalind B. Penfold (Mas ele diz que me ama) e Marjane Satrapi (Persépolis).

Need more love é, naturalmente, uma autobiografia em quadrinhos. E é mais do que isso: também é um projeto editorial magistral, de proporções graúdas e ambiciosas.

O livro tem quase 400 páginas em papel couché de boa gramatura, capa dura, costura e sobrecapa. No miolo, a autora mescla texto em prosa com seus quadrinhos, pinturas, fotografias e registros de suas esculturas-instalações de bonecas trash, além de uma grande entrevista. É uma autobiografia multimídia, em que as linguagens conversam para contar a trajetória marcante de uma mulher que se dividiu entre os papéis de esposa, artista e musa.

Logo se tem uma imagem nítida de quem é Aline: uma mulher vigorosa, uma judia que nunca se encontrou em Long Islang (ou sua Guy Land), mas conseguiu se libertar entre os hippies e os artistas nos anos 60. Profundamente vaidosa, descobriu-se dona de um potencial criativo incontrolável, capaz de dominar todos os detalhes da casa em que os Crumb moram no sul da França.

Seus quadrinhos carregam essa energia criativa dentro de si. Mesmo quando apressados, mesmo quando toscos, são intensos, brutos, profundamente expressivos. Para fazê-los, Aline transforma-se em uma força da natureza.

Chega até a confessar que não sabe desenhar uma mão até hoje, mas não importa: o que peca no refinamento técnico, Aline ganha em sua criação explosiva, com roteiros sinceros, detalhes minuciosamente mostrados e cores exuberantes.

Mais do que compilar a obra de Aline, Need more love é um projeto que faz justiça a uma autora ímpar, que por acaso o maior amor foi justamente um dos poucos monumentos capaz de lhe fazer sombra nos quadrinhos.

Classificação:

4,0

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