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São Jorge – Volume II – A última batalha

24 outubro 2014

São Jorge – Volume II – A última batalhaEditora: Panini Comics – Série em duas partes

Autor: Danilo Beyruth (roteiro e arte).

Preço: R$ 19,90

Número de páginas: 124

Data de lançamento: Agosto de 2014

Sinopse

No terceiro século depois de Cristo, após o tribuno Jorge enfrentar adversários em Alexandria, uma rede de intrigas se forma no palácio do imperador Diocletianus, em Roma.

Por intermédio de manobras nos bastidores do poder, ser defensor da causa cristã em meio às fileiras romanas marcará de vez o destino do protagonista, quando uma nova lei estabelece como crime subversivo passível de morte propagar a religião no Estado.

Ainda sem saber de tal edito, Jorge terá seu nome gravado em definitivo nas páginas da História ao ter seu confronto final com a terrível criatura assassina que aterroriza a cidade de Cyrene.

Positivo/Negativo

Depois de consolidar o prestígio de Jorge frente ao imperador romano e colocá-lo como vítima de um joguete político desenvolvido no primeiro volume, Danilo Beyruth prossegue com o segundo e derradeiro confronto do personagem com o “dragão”.

Boa parte do álbum é dedicada ao embate, uma sequência empolgante de ação que o autor domina bem, na qual a diagramação dita o galope e os golpes até a já aguardada e emblemática splash page.

Apesar de ter um pé na realidade, o feito excepcional remete à figura arquetípica do herói e, consequentemente, do super-herói. É interessante notar a presença da característica ideológica na iconográfica por meio do uso da capa, um adereço também lembrado e evidenciado na obra 300 de Esparta, de Frank Miller.

Costurando o pano de fundo mitológico com a versão histórica, Beyruth não ignora outras características plurais do São Jorge. Um bom exemplo é quando o personagem arranja um local para descansar e, precariamente, vai forjando uma lança (instrumento que tem papel fundamental em Alexandria e que virou forte símbolo junto com o cavalo branco).

Em diversos cultos das religiões afro-brasileiras, ele é sincretizado na forma de Ogum: no candomblé, a entidade é o orixá ferreiro; já na cultura haitiana, um espírito do ferro e fogo.

Após altas doses de ação, Beyruth conduz a narrativa para um confronto do tribuno com outros tipos de “dragões”, igualmente mortais e perigosos: o político e o ideológico.

Não menos empolgante, o leitor observa no desfecho a ascensão de um mártir que evidenciaria e divulgaria o cristianismo em meio a uma então pequena parcela de devotos, diante de um império pagão em declínio.

A minuciosa e precisa pesquisa do autor também abre espaço para a criatividade simbólica, vide a série de devaneios que Jorge tem no calabouço. Tais delírios chegam a questionar dogmas cristãos seguidos pelo tribuno, como o 13º mandamento. Ele usa a sua espada apenas quando necessário, mas não se sente realizado ou feliz com isso. O futuro “santo guerreiro” que por vezes não oferece a outra face.

Para o leitor desatento, Vera, a pequena e muda criança é o maior simbolismo usado pelo quadrinhista ao longo da narrativa. Seu nome vem do latim e significa “verdadeira”, “sincera”, “a que tem fé”. Quando Jorge a salva do “dragão”, a garota vai com ele para a cidade e o acompanha além de sua morte.

Talvez se o autor tivesse ocultado o nome desde a aparição da personagem no primeiro volume e deixasse a revelação para o final, a alusão ganharia mais força e percepção.

Junto com Valente, de Vitor Cafaggi, é bastante louvável a iniciativa da Panini de publicar autores nacionais, principalmente levá-los para se popularizar nas bancas. Mas seria igualmente bom rever algumas estratégias editoriais.

O principal problema deste volume é a opção equivocada de manter as mesmas cores e leiaute da capa. Chegando numa banca – além do jornaleiro geralmente acondicionar o produto em espaços de difícil acesso –, a capa acaba atrapalhando o leitor na identificação da nova edição.

Não basta apenas mudar a arte dentro da cruz vermelha (adornada com mais sangue) e o subtítulo Volume II – A última batalha. O mais desavisado passará batido achando ser a primeira parte, o que pode gerar possíveis declínios de venda, infelizmente.

Além disso, algumas notas editoriais só enriqueceriam a obra. E assuntos não faltam.

De acordo com Danilo Beyruth, ele próprio negociou questões como o formato da edição (16 x 21 cm – um pouco menor que o popular formato americano, que é 17 x 26 cm) e a divisão em duas partes, com intuito de se adequar à realidade de mercado.

Para este resenhista, o formato não desvalorizou o trabalho do autor, mas o tamanho das letras chega a incomodar em falas e diálogos maiores.

Apesar do papel offset de boa gramatura e impressão, a edição não é montada e costurada em cadernos. Dependendo da colagem das páginas avulsas, futuramente elas podem se soltar, principalmente nos extremos do volume.

Outra questão crucial é o preço. Sem a ciência da divulgação de sua tiragem – um dos fatores importantes para a definição do valor –, São Jorge é caro se comparado, por exemplo, à qualidade apresentada em uma Graphic MSP de capa cartonada (também da Panini), que custa o mesmo montante.

Mesmo sendo um projeto digno de reconhecimento, a editora poderia estudar novos meios de ampliar o público de quadrinhos viabilizando o equilíbrio entre custo e benefício.

Independentemente disso, São Jorge é uma obra que merece ser conferida e ser responsável pela introdução de novos leitores nessa boa fase que vem passando a HQ nacional atualmente.

Classificação

4,0

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