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Entrevistas

Um retrato fiel do mercado

3 março 2001

Entrevista: Editora Escala

com Dario Chaves (Editor)

Editora EscalaUniverso HQ: Qual a sua opinião sobre o mercado de quadrinhos no Brasil hoje? O que esperar desse mercado no próximo ano?

Dario Chaves: Pergunta difícil de ser respondida, porque a resposta vai parecer ambígua. Vejo com bastante preocupação a saída do formatinho da Editora Abril das bancas, pois o novo formato, com edições mais luxuosas e caras, inibe a formação de novos leitores e afasta uma grande parte dos leitores habituais, devido ao seu alto preço de capa. Por outro lado, a quebra do monopólio dos comics sendo publicados única e exclusivamente por uma editora abriu um leque de possibilidades e o surgimento de pequenos e médios editores no universo das HQs. E este fato é bastante positivo. Com isso, surge a possibilidade do público consumidor ter acesso a temas mais variados e abrangentes. Vislumbro, para este e para o próximo ano, um momento bastante positivo para os apreciadores da arte seqüencial.

UHQ: Quais os principais problemas que você vê no mercado nacional? O que acha que deveria acontecer para mudar esse panorama?

Dario: Esta também é bastante complexa. Um dos principais problemas é a falta do público consumidor, quer pelo poder aquisitivo da maioria da população, quer pela falta de costume de leitura. Isso afeta o mercado editorial como um todo, que tem um dos índices mais baixos de revistas vendidas por habitante, se comparados a Europa e Estados Unidos. Por outro lado, se este fato reflete a nossa realidade, também demonstra que a possibilidade de se formar público é muito maior. Há mais espaço a ser conquistado. Diversificar os temas, tentar baixar os preços de capa, lançar novos produtos, enfim, formar mercado deve fazer parte de uma estratégia para que se mude o panorama atual.

UHQ: Qual o balanço que a sua editora faz do ano 2000?

Dario: A Escala vem alcançando um crescimento anual em toda sua linha de produtos. Terminou o ano de 1999 vendendo algo em torno de 1.100.000 exemplares no mês de dezembro; e ultrapassou a casa de 3 milhões de revistas vendidas, em dezembro de 2000. Esses números referem-se a um mix de produtos, e não exclusivamente HQs. Não é esta a realidade do produto específico HQ, mas, com certeza, tanto o volume de lançamentos quanto as vendas, foram superiores a 99. O que torna o saldo positivo.

UHQ: Quais são os planos da sua editora para 2001? O que vem por aí?

Dario: A Escala deve manter para 2001 uma perspectiva de crescimento em volume de títulos e vendas. Especificamente na área de HQ, deve dar continuidade aos produtos já existentes e investir em novas áreas, como os quadrinhos infantis, para testar a aceitação do público – com ênfase na produção nacional.

UHQ: Hoje, a história em quadrinhos é um produto caro. É possível reverter esse quadro ou a tendência é isso se manter?

Dario: A característica da Editora Escala sempre foi a de popularizar os seus produtos. Por isso mesmo, tem os menores preços do mercado. Incluindo aí a área dos quadrinhos. A idéia é manter essa filosofia, e espera-se que, a longo prazo, consigamos formar um público consumidor e emplacar algum produto com maior força.

UHQ: Mesmo nessa tremenda crise, poucas vezes tivemos tamanha variedade de lançamentos. O leitor pode optar entre super-heróis, europeu, manga, quadrinho adulto, erótico, nacional etc, mas todos com tiragens reduzidas e preços altos. Como você encara essa segmentação?

Dario: Esta informação não é inteiramente verdadeira, pois a Editora Escala, através do seu selo Xanadu, nunca publicou tantos produtos a preços visivelmente baixos. Todos eles com tiragens variando entre 30 e 70 mil exemplares, que são volumes respeitáveis em qualquer parte do mundo. O aparecimento de um mercado segmentado com preços altos faz parte da própria evolução dos produtos e do público-alvo.

UHQ: Por muito tempo, os quadrinhos de super-heróis dominaram o mercado nacional. Você acha que essa diversidade de títulos é sinal que eles estão em decadência?

Dario: A diversidade de títulos demonstra que o público consumidor está evoluindo e se diversificando, devido também ao aparecimento de editoras dispostas a investir em temáticas diferentes das de super-heróis. Acredito que a questão da queda dos super-heróis deva ser analisada também por outros aspectos. A concorrência de outros meios de entretenimento, em relação a outras décadas, é visível, o que acaba refletindo nas vendas. Mas não acredito que isto signifique o fim do estilo super-heróis.

UHQ: Você acha que a falta de revistas e críticas especializadas no setor afeta o mercado?

Dario: Um mercado que não sustenta uma produção regular do produto final que é a revista em quadrinhos, dificilmente, poderia absorver uma revista especializada no assunto. Um pensamento um tanto quanto óbvio, já que se o leitor não tem dinheiro nem para comprar sua revista em quadrinhos, não terá provavelmente interesse em comprar uma revista que fale sobre quadrinhos.

Escala vem mantendo, com sucesso, uma revista informativa, a “Comix Book Shop Magazine”, devido a seu preço de capa bastante acessível, mas, principalmente, ao mix de temas que aborda, incluindo animação japonesa e seriados de tevê. Essa linha editorial significou um pulo gigantesco para o produto, que passou de uma venda não superior a 12 mil exemplares (quando tratava somente de quadrinhos), para patamares variando entre 60 e 100 mil exemplares, depois da adoção da nova linha abrangendo temas ligados à animação e tevê. Essas mudanças proporcionaram um aumento também da periodicidade. A primeira fase teve 8 edições num período de 1 ano; enquanto a segunda, num intervalo idêntico, foi do nº 9 a 30! Aproveitamos, então, este crescimento do público leitor para tentar atrair novos interessados ao universo dos quadrinhos.

UHQ: Qual sua opinião sobre a distribuição no Brasil?

Dario: A parceria firmada, a partir do segundo semestre de 1999, entre a Editora Escala e aDistribuidora Fernando Chinaglia é, com certeza, um dos fatores determinantes do sucesso que a Escala alcançou a partir deste período. Muitos editores se queixam do sistema de distribuição no Brasil, colocando-o como o principal empecilho para o sucesso de suas publicações. Há que se ressaltar aí que a distribuição para bancas de jornal no Brasil tem um aspecto universal; e não específico, como desejam alguns editores. Talvez daí decorra grande parcela das queixas relacionadas à distribuição.

HQ - Revista do Quadrinhos Brasileiro Pervers

UHQ: Os quadrinhos estão, cada vez mais, migrando para as livrarias. O que você acha desse nicho?

Dario: A Editora Escala por enquanto não atua nesse nicho com produtos de quadrinhos.

UHQ: A Escala lançou o curso de desenho para quadrinhos nas bancas. Qual foi o retorno desse material? Como está o projeto?

Dario: A filosofia da Editora sempre foi de investir em novos projetos. Alguns desses projetos são vitoriosos, caso da revista “Curso Prático de Desenho”, que, em aproximadamente um ano e meio, se desenvolveu em uma série de outros produtos, como “Curso Básico de Desenho”, “Curso Básico de Mangá”, “Método de Desenho Erótico”, “Como Fazer Desenho Animado”, “Curso Prático de Desenho Comercial e Publicitário”, “Me Desenhe”, “Guia de Referências”, “Desenhe e Publique Mangá”. Ou seja, foi uma área em que a iniciativa, a princípio inovadora, proporcionou a criação de um segmento novo ligado ao universo dos quadrinhos. Esse segmento teve um boom que a editora aproveitou adequadamente, com grande número de lançamentos, recuou um pouco e hoje se mantém mais estável, com três produtos regulares e alguns especiais, de acordo com a demanda.

UHQ: Vocês trabalharam basicamente com artistas nacionais. Qual a repercussão desse trabalho junto aos leitores? Vocês recebem muitas histórias de gente querendo publicar? Podem destacar algum “novo talento” que tenham descoberto através das revistas?

Dario: Desde sua criação, a Editora Escala apóia e fomenta novos produtos. A questão de investir em autores nacionais faz parte da filosofia da empresa, de acreditar em novos projetos. Embora seja a editora que mais publica autores nacionais, não há como ter certeza se o público se dá conta desse volume.

Recebemos dezenas de histórias a cada mês, particularmente quando criamos a seção “Arte do Leitor”, na HQ – Revista do Quadrinho Brasileiro. Esta seção não tem os mesmos critérios exigidos aos profissionais, possibilitando a autores amadores terem seus trabalhos publicados. Como o número de bons autores é grande, tentamos dar espaço para a maioria, na medida do possível. Tanto que acabamos criando uma revista exclusivamente voltada para autores amadores, fãs de mangá, que é a revista “Desenhe e Publique Mangá”. A cada número, autores diferentes são selecionados. Todo novo autor publicado em nossas revistas pode ser considerado “novo talento”. Mas somente o leitor, e o tempo, é que dirão se ele poderá vir a ter ou não algum destaque profissionalmente.

UHQ: Qual a atual situação no mercado de bancas?

Dario: A Editora Escala e seu selo Xanadu só atuam em bancas. E tem no jornaleiro o seu principal aliado. Por este motivo, não vende assinaturas. E como também não vende publicidade em seus produtos, vive única e exclusivamente da venda em bancas.

UHQ: A situação econômica hoje é desfavorável para os quadrinhos. O preço de suas edições é um problema?

Dario: O mercado editorial como um todo tem crescido nos últimos anos. Principalmente nos segmentos mais populares. É óbvio que os produtos com preço mais elevado estão enfrentando cada vez mais dificuldades. Mas as perspectivas econômicas para 2001 nos parecem bastante favoráveis, com o aumento do nível de emprego e da massa salarial, o que deve refletir positivamente sobre as vendas, incluindo aí o universo dos quadrinhos.

UHQ: Seus lançamentos de 2000 foram sempre com artistas nacionais. A idéia é continuar nessa linha ou vocês publicarão também autores estrangeiros?

Dario: A linha editorial da Escala deve ser mantida e não há, a médio prazo, perspectiva de lançamentos de títulos estrangeiros.

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